domingo, 21 de julho de 2013

Pequeno conto escrito faz cerca de 10 anos! Achei em um notebook velho.....

Aí vai....



Banho Doce


         O corpo já demonstrava o cansaço do dia.....desde a manhã ela andou, correu, falou ao telefone, aturou e suportou pessoas que de uma forma ou de outra cruzaram o seu caminho.

         O sol já se punha, aquele céu alaranjado contrastava com a fumaça dos caminhões e dos ônibus que levavam as pessoas para casa, mas não ela. Ela em seu carro, ouvia uma música que a transportava para uma outra dimensão...

         Um leve arrepio na altura da nuca...A moça sentiu-se desprotegida em plena Avenida Paulista, quem ou o que lhe dava a sensação de percorrer seu corpo?  Ajeitou-se no banco, apertou o volante com força e se deixou levar por aquela sensação estranha, intrigante, sensual, enfim deliciosa.

         O trânsito teimava em conspirar contra a necessidade que a consumia, um simples banho a faria feliz, fechou os olhos e foi quase possível sentir a água viajando pelos seus poros, pelos, em toda a sua extensão...

         De súbito, foi acordada de seu transe, ao olhar para o retrovisor, quase sorriu, porém conteve seu desejo, com receio da multidão que se postava atrás, indignada com aquela mocinha que despretensiosamente ousava em ficar parada em plena Sexta-feira com o sinal verde se oferecendo.

         Ao descer do seu carro, esticou os braços, as pernas involuntariamente se contorceram, o estalar dos dedos foi um reflexo natural. A pressa que tivera até então, foi substituída por uma quase inércia. Antes era impedida de chegar a seu descanso, agora que ele chegara, parecia tão fácil dele usufruir, que só de birra, passou a criar obstáculos para ele, numa criancice sem precedentes... passou a divertir-se com o carro, as mãos suavemente fecharam os vidros, as pernas num leve toque fecharam a porta, pensou em algo ousado, mas já perdera a graça.

         A geladeira foi o primeiro alvo de sua desforra, o suco de laranja foi sugado em segundos, o excesso que escorreu em sua boca, blusa, nem foi levado em consideração, tamanho o prazer que ele, o suco, lhe estava proporcionando.

         As roupas eram sem nenhuma preocupação, atiradas ao chão, antes escolhidas a dedo em lojas de grife, hoje somente lhe restavam o azulejo frio da cozinha, o carpete da sala, o braço da escada, a peça última, privilegiada que foi, teve a maciez da cama como alento.

         O barulho da água tocando o chão...o leve respingo em seu rosto....A moça em fim, estava prestes a entrar na dimensão que tanto sonhara. Enquanto a banheira era devidamente preenchida com a água em sua temperatura ideal e enriquecida com sais, florais e outros que tais....A moça deixou-se jogar para dentro do chuveiro, da primeira gota a molhar-lhe a testa até as demais incontáveis gotas se apossarem de todo o seu ser, passaram-se segundos, décimos até, mas para, ela, somente ela, o tempo parou, congelou. Só era possível sentir a pele esfriar, o corpo relaxar, os cabelos aloirados molharam-se. E, como bela ela estava, molhada, livre, entregue por completo. Quantos homens, senão todos que possam assim ser considerados, não dariam tudo para serem reduzidos a um milímetro entre milhões de metros cúbicos de água por aí espalhados.

          Nem uma bomba atômica teria igual efeito devastador, aquele pequeno aparelho estridente, era responsável por um verdadeiro crime, ou melhor dois, o primeiro era tirar aquela moça de um estado antes nunca experimentado, o segundo era para quem quer ou o que estivesse a seu redor, ver aquela mulher, aquele corpo, se cobrir, mesmo que parcialmente pela toalha, que chata, estava, aonde infelizmente, deveria estar.

         A indignação era patente.

         - Como pode ? me tirar do banho, para isso ? - disse brava, em voz alta, mas sem repartir o conteúdo da conversa, com nós pobres mortais que a acompanham em sua trajetória.

         O telefone, antes odiado, foi o responsável por salvar seu meigo apartamento de ser inundado, a banheira já estava prestes a transbordar, a espuma, tocava o teto....- puro exagero do narrador- ....Sua mão, procurou por entre a água e espuma a torneira, enfim a achou.

         Livrou-se da toalha (os aplausos inaudíveis ecoaram pela casa). Ah, mas que perfeição... se ateu fosse, naquele ato me converteria, somente um ente chamado de Deus, poderia criar algo tão belo.... Frágil e poderosa, suave e forte, contradições ininteligíveis mas absurdamente apaixonantes.

         A medida em que seu pé foi engolido pela espuma, sua mente antecipava as horas de incontrolável relaxamento que estavam por vir...As coxas, as pernas, tudo.....foi sumindo à medida que ela ia se deitando na banheira....Com o corpo já todo coberto, esgueirou-se e ligou a hidromassagem. Nem Cristo a tiraria dali.

         A música que vinha do rádio, do quarto, ajudava-a a viajar, seus pensamentos eram vários e nenhum ao  mesmo tempo....

         Mordia de vez em quando o Croissant que esperta que era, trouxera para lhe fazer companhia....O seu corpo exigiu, e ela cedeu, uma mudança de posicionamento se fazia necessária, mesmo completamente apolítica, nada mais lhe restava do que apoiar a esquerda e para lá dirigir seus esforços.

         De repente, não mais do que de repente, no meio dessa mudança de partido, sentiu algo inesperado, aquele arrepio que sentira horas antes na Avenida Paulista, se repetira, só que com maior intensidade...

         Um barulho, igualmente inesperado, veio do andar de baixo, pensou em levantar, mas o medo, a tensão, o relaxamento e a própria imaginação de imaginar o fato de ser observada, nua, totalmente indefesa, a deteve.

         O arrepio teimava em queimar-lhe a nuca....Estaria a água muito quente ? Com medo, talvez, fechou os olhos....

         Seus lábios secos, molharam-se com sua própria língua....abriu os olhos, e realizou que não era verdadeira tal assertiva, um homem, estava a lhe beijar, ficou ofegante, as palavras não saíam de sua boca....sua cabeça estava a mil por hora, mas estava incapaz, de se defender, falar, agir, somente olhava, e principalmente sentia....

         O homem entrou na banheira, a água escorria pelo chão, os corpos se tocaram embaixo da água...a moça não mais se continha...o beijo...era cada vez mais forte, quente, avassalador. O arrepio agora tomava conta do corpo inteiro...Os seus seios eram tocados, de uma forma carinhosa, suave, feminina, como se o fossem por uma mulher....

         O aparelho estridente novamente voltou a estrilar...os movimentos passaram a ser rápidos...frenéticos...a respiração ofegante....Ou atendia aquele objeto ora odiado, ora nem tanto, ou ali ficava,  sentindo.... A segunda opção ganhou por votação unânime.

         Os olhos abriram, a moça assustou-se, ao ver-se com as pernas entreabertas, a água a pressionar-lhe...suas mãos em seus seios....apesar de estar tomando banho, estava suada......Um sonho...apenas....mas que sonho!!!....Nunca tivera uma experiência sensorial assim tão forte, real, e com efeitos tão vibrantes em seu corpo.

         O telefone que a despertara, parou de tocar....Respirou fundo, endireitou-se dentro da banheira e deu uma mordida, no croissant, agora de chocolate, e ligou para uma amiga, precisava repartir aquela experiência....
 
         - Oi, sou eu. - disse para a amiga, e completou - Você precisa saber o que aconteceu no meu banho, - e olhando para o croissant falou. - no meu banho doce.....doce banho

Nenhum comentário:

Postar um comentário